Escrivão de Policia aposentado resolve quebrar silêncio para sair em defesa do filho, preso há quase 10 meses num CDP em Guarulhos: "Ele jamais tiraria a vida de outra pessoa. Muito menos com a crueldade que fizeram com a Estéfani."
Por Ricardo Nogueira
O trágico episódio que tirou a vida de uma adolescente em Arapeí, em junho de 2022, ganha um novo capítulo: o pai do acusado de ser autor do crime, detido pela polícia há quase 10 meses, resolveu externar para a imprensa seu inconformismo com a prisão do filho, afirmando que ele é inocente. Sob sua ótica, o inquérito que incrimina o filho apresenta falhas e desconsidera pontos importantes que comprovam sua inocência.
Enquanto aguarda julgamento de recursos nos tribunais superiores, o Escrivão de Polícia aposentado Pedro Carlos Duarte resolveu procurar a Gazeta de Bananal para iniciar uma escalada em defesa do filho, quebrando o silêncio do único lado da história que ainda não havia se manifestado publicamente. "Todos já falaram com a imprensa sobre esse caso e acho que temos esse direito também", reivindicou ele.
"Existem duas injustiças nesse caso", pontua Pedro: "Um inocente está preso e o verdadeiro culpado está solto. São duas famílias sofrendo, enquanto o culpado está livre: a família da vítima, maior prejudicada, sem saber que a morte da filha continua impune, e a minha, que vive inconformada por uma prisão injusta. Só a fé em Deus é que nos faz acreditar que esse erro será corrigido pela Justiça".
O caso tramita em segredo de justiça e, mesmo com as limitações que essa restrição impõe, Pedro considera ter chegado o momento de, como pai, lutar pela liberdade do filho: "Meu filho é inocente. Qualquer pessoa que o conhece sabe que ele não tem perfil de homicida. Ele é tímido, introvertido, nunca se envolveu em confusão e jamais tiraria a vida de outra pessoa. Muito menos com a crueldade que fizeram com a Estéfani", afirma Pedro, que batizou o filho com o seu nome.
O CRIME
Na tarde de 17 de junho de 2022, o corpo de Estéfani Lorenço Alves da Silva, de 17 anos, foi encontrado sem vida num logradouro da área central de Arapeí. Ela havia saído de casa no dia 12, um domingo, dizendo que iria para uma Exposição - com shows musicais para festejar o Padroeiro da cidade -, pegar o celular que havia perdido na noite anterior. Segundo relatos, ela ficou com amigos e foi vista com vida pela última vez por volta das 3h da madrugada do dia 13 (segunda-feira), no local do evento. No dia seguinte, por não aparecer em casa, familiares e amigos dela começaram a usar as redes sociais para saber de seu paradeiro. As postagens foram compartilhadas nos dias seguintes com o intuito de ajudar a família na busca.
Quatro dias depois, o corpo foi encontrado por Pedro Carlos Duarte Júnior, então com 28 anos, filho do Escrivão aposentado, que acionou os policiais.
Segundo a Polícia Civil, próximo ao corpo havia uma pedra, um pedaço de pau e uma caixa de fósforos. Como a vítima estava desfigurada, atingida no rosto e tórax, foi levantada a hipótese de ter sido morta por golpes desferidos com a pedra e pauladas. A vítima estava de calça e tênis, sem blusa.
Na ocasião, a perícia foi acionada para dar curso às investigações sobre as circunstâncias da morte de Estéfani. O corpo foi encaminhado para o IML de Cruzeiro. Não foram encontrados indícios de violência sexual.
Após os exames necroscópicos, o corpo da adolescente retornou no dia 18 de junho para ser velado e sepultado no cemitério de Arapeí.
O celular da adolescente, que a atraiu para o evento, não foi encontrado junto ao corpo.
REPERCUSSÃO NA MÍDIA
O crime chocou a cidade, que tem um dos menores índices de violência do estado, e gerou grande repercussão na imprensa, saindo em portais de notícias e TVs de alcance regional e nacional.
Delegados e investigadores foram ouvidos pelos órgãos de comunicação no curso das investigações e várias hipóteses foram levantadas, incluindo a possibilidade de Estéfani não ter sido morta no local onde o corpo foi encontrado. Também surgiram relatos de que ela foi vista junto a um carro preto e de gritos ouvidos em ponto distante do centro, na rodovia estadual que corta a cidade.
A PRISÃO
Nove meses e meio depois do crime, mais precisamente em 03 de abril de 2023, a polícia efetuou a prisão de Pedro Carlos Duarte Júnior, o homem que havia encontrado o corpo. Ele foi detido sob a suspeita de autoria do homicídio e levado para a Delegacia de Cruzeiro. Posteriormente, foi transferido para um Centro de Detenção Provisória, em Guarulhos.
Na ação, a polícia utilizou um cão farejador e uma substância química (luminol). encontrando sangue humano na camisa do suspeito. Fotos da operação foram disponibilizadas pela polícia para a imprensa.
Pedro Júnior foi detido em sua casa, no centro de Arapeí, após a expedição de um mandado de prisão pela Justiça.
Na ocasião, a família do acusado resolveu silenciar, já que a comoção com o crime foi muito grande e seria difícil tentar convencer a opinião pública do contrário. "Algumas pessoas começaram a olhar esquisito para a gente. Uma prisão dessa faz as pessoas acreditarem na culpa de quem foi preso. Muita gente acreditou na acusação, mas várias outras não. Quem conhecia bem o Pedro (Júnior), meu filho, sabe que ele jamais faria isso. Foi nessas pessoas que encontramos forças para continuar a nossa vida, acreditando que tudo seria esclarecido. Meu filho nem conhecia a Estéfani", declarou o escrivão aposentado.
A opção inicial pelo silêncio deu lugar agora ao objetivo de contrapor publicamente as acusações feitas contra Pedro Júnior.
"Só resolvi falar agora com a imprensa porque sempre achei que os erros do inquérito seriam notados pela Justiça. Para minha surpresa, não foram e meu filho está lá, preso injustamente em Guarulhos. Longe da família e adquirindo traumas que não sabemos como lidar quando esse pesadelo passar".
ERROS DO INQUÉRITO, SEGUNDO O ESCRIVÃO APOSENTADO
Alegando estar baseado na experiência das décadas de trabalho como Escrivão em Delegacias, Pedro acredita que a policia enveredou por uma linha de investigação extremamente falha e isso prejudicou seu filho.
Com um papel na mão, ele solicitou que suas anotações fossem reproduzidas pela reportagem conforme segue:
(...) " - sobre a camiseta que a polícia usa como indício de autoria:
a) a perícia encontrou uma gota do tamanho de um grão de arroz de sangue humano masculino, sem especificar de quem;
b) a polícia apreendeu a camiseta utilizada no dia 12 de junho de 2022, sendo que todos os laudos que constam dos autos afirmam que a vítima faleceu a partir do dia 16, não antes.
- muitas ligações para o celular da vítima foram concluídas depois do dia 12. A polícia pediu a quebra do sigilo telefônico, mas sequer se preocupou em levantar os titulares dessas linhas. Nenhuma das ligações é de meu filho.
- diversas testemunhas relataram que a vítima vinha sofrendo ameaças de morte e citaram os ameaçadores, mas a polícia não procedeu nenhuma diligência mais efetiva contra essas pessoas, tais como quebra do sigilo, busca e apreensão etc. Sem contar que uma das testemunhas, amiga da vítima, afirma que foi interrompida ao tocar no assunto, porque os policiais disseram que isso não era importante.
"Dessa forma, eu concluí que essa investigação, falha e omissa, está acarretando um erro judiciário grave que mantém meu filho encarcerado há mais de 10 meses injustamente. Nem sequer identificaram as 3 pessoas com a qual a vítima foi vista por ultimo entre 2 e 3 horas da madrugada do dia de seu desaparecimento", encerra as anotações no papel.
Essas e outras evidências, segundo Pedro, mostram que, ao contrário do apontado no inquérito policial, Estéfani não foi assassinada no local onde foi encontrada e o crime ocorreu depois do dia 13, provavelmente no dia 16 ou mesmo no dia 17, quando foi encontrada na parte da tarde.
O Inquérito Policial criticado pelo Escrivão aposentado serviu de base para a denúncia oferecida pelo Ministério Público, acolhida pela Justiça em Bananal, que determinou a prisão do acusado.
Procurados pela reportagem, os advogados de defesa Márcio de Paula Antunes e Adolpho Henrique de Paula Ramos não quiseram comentar o caso, limitando-se a dizer que seu cliente é inocente.