70 anos de tradição e devoção: tapetes de Corpus Christi unem gerações e comunidades em Bananal

 

Tradição iniciada há sete décadas por Dona Dora em frente da igreja de Nossa Senhora do Rosário agrega arte e devoção, unindo gerações no preparo dos tapetes "para Jesus passar"

Por Ricardo Nogueira 

A tradicional procissão de Corpus Christi, celebrada há mais de um século em Bananal, ganhou em 2025 um significado especial por completar 70 anos dos tapetes ornamentais que enfeitam o trajeto de rua. Embora o cortejo religioso seja secular na cidade, a prática de ornamentar as ruas com os tapetes em desenhos coloridos, teve início em 1955, numa iniciativa da professora Doralice Costa Oliveira, a Dona Dora. Diante de uma rua ainda de chão batido em frente à Igreja do Rosário, ela criou o primeiro tapete com a imagem de Nossa Senhora, usando pó xadrez.

Sete décadas depois, a tradição se renova e se fortalece, impulsionada pelo entusiasmo dos fiéis, irmandades católicas, servidores públicos, jovens das catequeses e voluntários que, com talento e fé, mantêm viva essa expressão de devoção. E a tradição dá sinais de vigorar por muito tempo.

Em 2025, na rua Comendador Ferreirinha, trabalhando num desenho próximo ao cartório de Notas e Protestos, o estudante de medicina Enrico Capeto Ramos, 25 anos, universitário em São José dos Campos, contou que aprendeu a importância da tradição com sua família bananalense, sentindo prazer em contribuir: "A gente cresce vendo e entendendo o valor que tem essa celebração. É bom voltar pra cidade e ajudar numa tradição que é passada de geração em geração na família."

A bananalense Maria Cecília Duque Neiva, de 14 anos, também demonstrou o significado da data para os mais novos: "Desde pequena venho com minha família. É importante preparar os enfeites para Deus passar." Já Hillary Duque Oliveira, 18 anos, natural de Barra Mansa e moradora de Bananal, ressaltou o valor espiritual da experiência: "É uma forma de evangelizar nós mesmos e o próximo também. A gente sente uma paz e fica realizada."

A logística de armazenamento e distribuição da matéria prima para a confecção dos tapetes conta com apoios que vão desde jovens da catequese, passando por servidores públicos e outros voluntários que, há décadas, agregam familiares e amigos.

O potencial de mobilização comunitária também se estendeu às escolas da rede municipal, que prepararam desenhos e colagens para a ocasião. Ao redor da praça Rubião Júnior, os trabalhos dos alunos da Escola Municipal Coronel Nogueira Cobra ficaram expostos, encantando os moradores e visitantes.

A vice-diretora da escola, Crislane Maria Valentim Bastos Mendes, vivencia esta tradição desde a sua infância, com o Monsenhor Cid França Santos, passando por seus sucessores: "a tradição sempre existiu, mas foi o padre Rodrigo que teve a ideia de enfeitar trechos do percurso com trabalhos das escolas municipais (Zenóbia, José Luiz e Nogueira Cobra), atraindo o interesse dos alunos e suas famílias."

Anderson Fagundes, Diretor do Nogueira Cobra, salienta a importância de manter a tradição e levar Deus aos corações das crianças através de um trabalho voluntário dos alunos. "O trabalho é feito de forma espontânea, independente de religião e isso nos motiva. A palavra que eu tenho nesses momentos é gratidão".

A Coordenadora Pedagógica Elizabeth Isoldi explica que as temáticas são trabalhadas em salas de aula com os alunos. Neste ano, dentro do contexto da Campanha da Fraternidade, o tema conscientizou sobre o meio ambiente: "uma temática atual e que chama atenção para a preservação da natureza para as futuras gerações", explicou ela. A Coordenadora considera que o trabalho é também uma maneira de trazer os pais e a comunidade para participar mais ativamente do trabalho.

E no local onde tudo começou, em frente à Igreja do Rosário, a tradição segue firme pelas mãos dos familiares de Dona Dora, que hoje está com 104 anos. Apesar da idade avançada, com problemas de mobilidade e de visão, a família tenta mantê-la sintonizada com o carinho das pessoas pelo legado que deixou. Segundo seu filho Alfredo Costa Gomes de Oliveira (Alfredinho), a família se empenha todos os anos para manter viva essa história de fé: "Ela sabe que vamos manter essa tradição". A filha de Alfredinho, a artista Samantha Karam Oliveira, enfatiza o legado da avó: "Ela sempre ensinou a gente a fazer o bem e ajudar as pessoas. Como professora de Artes ela nos passou esse legado e vamos manter até quando nós pudermos."

A beleza dos desenhos, retratando cenas bíblicas, vitrais de igrejas e temas religiosos, é o ponto alto das celebrações a cada ano. Além da expressão artística, os tapetes eternizam memórias, reforçam o espírito de união e religiosidade que marca Bananal — uma cidade onde o passado e o presente caminham juntos. No caso específico dessa tradição septuagenária, lado a lado com a fé.




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